quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

ENTREVISTA COM NELSON DA FARMÁCIA

CONHEÇA A HISTÓRIA DO HOMEM QUE HÁ MAIS DE 30 ANOS ATUA NO RAMO DE FARMÁCIA EM UPANEMA

Conhecido por muitos como “Nelson da Farmácia”, seu Manoel Nelson já foi dono de bar, vendedor de rapaduras, Vereador, candidato a prefeito e finalmente dono da farmácia mais antiga da cidade. Confira essa história:
Por Francisco Xavier, Anaximandro Eudson e José Mário
JU – Seu Nelson, primeiramente gostaríamos que o senhor contasse como foi adquirida sua farmácia?

NELSON DA FARMÁCIA - foi comprada a Raimundo Cândido. Na época eram duas farmácias: Socorro Farmacêutico e a de Antonio de Elizeu. A primeira farmácia em Upanema foi de Cândido Martins, sendo passada pra Chico Medeiros. Este vinha lá pra seu Augusto e que todas as segundas-feiras vinha extrair dente num carrão preto. Seu Chico Medeiros deixou a farmácia se acabar. Depois Raimundo Cândido foi requerer uma pra ele com o Conselho em Natal. Depois requereu e vendeu a Antonio de Elizeu. Depois Raimundo requereu outra e é justamente essa daqui.

JU – E quem podia fazer esse requerimento era só Raimundo Cândido?

NF - Não. Era porque ele sempre tinha costume de fazer isso. Então sempre fazia. E antigamente só podia ter uma farmácia, que no caso não era nem farmácia: era Socorro farmacêutico. Quando Raimundo Cândido fez, até Luiz Cândido achou que não podia fazer, mas requereu essa aí. Raimundo Cândido não era dentista, era apenas prático.

JU – Antes da farmácia, o senhor trabalhava com outro tipo de comércio?

NF- Sim. Por causa da farmácia eu vim pra cá. Antes eu trabalhava na agricultura na Santa Maria (Zona rural do município), onde eu nasci. Neidinha (a filha, cujo nome leva o nome da farmácia) também nasceu lá. Eu vim pra cá em 63 fabricar rede. Era eu e Antonio Lopes. Depois acabou a fábrica , aí fiquei na loja com Antonio Lopes. Como ele era candidato a prefeito, foi deixando a loja. Aí acabou. Depois coloquei um bar ali onde era a maternidade. Passei dois anos e vi que não dava certo. Eu deixei o bar porque eu não agüentava vender tanta cachaça. Naquele tempo só tinha energia até nove horas da noite. Chico Lopes, Maurílio, Valério, no tempo todos solteiros novos, então diziam assim: Nelson, eu vou fazer seresta hoje. Eu fechava o bar e entregava a chave e ia embora. No outro dia quando eu chegava, aí Maurílio assumia tudo o que eles tinham usado. Tava tudo em cima da mesa. Era só fazer a conta e Maurílio me pagava. Vendi o bar, e fui viajar de caminhão, em carro fretado. Trazia rapadura e saía vendendo de Apodi até aqui. Mas não deu certo. Eu estava atrás de comprar a farmácia, mas não sabia vender nada. Quando cheguei do Cariri, Raimundo Cândido já tinha vendido a farmácia a Antonio de Elizeu. Eu disse então: mas rapaz! Quando Raimundo Cândido morreu, eu já tinha a idéia e disse: agora eu vou pra farmácia. Ficaram duas famácias de seis a oito anos. Depois desse tempo, foi quando Antonio de Elizeu fechou a dele.

JU – Hoje em dia é melhor administrar uma farmácia do que antigamente?

NF - A Farmácia Neide tem trinta e dois anos.Antigamente era mais difícil. Hoje eu não sinto tanta dificuldade, não.

JU – Hoje a gente sabe que o senhor faz um pedido hoje e amanhã já chega. E antigamente como era?

NF - Antigamente eu tinha que ir a Natal. Eu pegava o ônibus, dormia em Mossoró pra ir de madrugada pra Natal comprar os remédios. Vinha de ônibus, voltava pra Mossoró, dormia pra no outro dia voltar pra cá. E isso eram oito dias pra chegar de Natal pra cá. Eram três dias de viagem e dormia duas noites em Mossoró. Pegava o ônibus em Mossoró. Em Natal, eu pegava a mercadoria na Ribeira. Lá eu andava a pé e de tarde ia juntar a mercadoria num táxi. De noite pegava o ônibus. Hoje é muito fácil: eu faço o pedido às oito horas da noite e de oito horas da manhã já está aqui. 

JU – O período que o senhor viveu foi na época em que aqui não tinha posto de saúde. O senhor muitas vezes foi acordado de madrugada pra atender algum cliente?

NF - Muitas vezes. Tinha noite que vinha três, quatro vezes pra despachar.

JU – O senhor também aplicava injeção?

NF - Nunca.

JU – Muita gente comprava remédio sem ser medicado?

NF - Comprava muito. Naquela época não tinha médico. A gente vai pegando a prática. Prestando atenção nos remédios que o médico vai passando que dá certo. Às vezes pra saber aí eu pergunto: o que é que você tem? Quando é um homem, eu pergunto. Se é mulher, eu não pergunto, não.

JU – O senhor nunca teve dificuldade pra ler receita não?

NF - Tem letra de médico que eu ainda me enrolo e não entendo nada. Quando acontece isso eu não vendo, porque não vou vender errado!

JU – O senhor lembra de algum comerciante daquela época e que ainda atua nos dias de hoje?

NF - Tem Chico Balbino, Olegário, Nem e Dona Maria Romana. E bem depois foi Carlinhos, Antonio Jerônimo e Santiago.

JU – Com relação à política, o senhor já foi vereador e candidato a prefeito? NF - Fui vereador duas vezes e já fui candidato a prefeito. Fui vereador de 63 a 67 e de 70 a 73. Na segunda vez só foi três anos.

JU – Como surgiu o interesse pela política?

NF – Foi com a convivência com Antonio Lopes. Ele era vereador e pelejou pra que eu fosse candidato. Então fui. Fui eleito naquela época com 76 votos. Em 1970 me elegi com 180. Quando foi em 1972 a gente apoiou Lucas, o pai de Evangelista. Em 1976 a gente apoiou Zé Fernandes, o pai de Dapaz. E em 1980 foi Dapaz. Depois desisti.

JU – Na época que o senhor era vereador, ganhava dinheiro?

NF - Não. Não ganhava nada não. Nem no segundo mandato eu ganhava. Quem veio ganhar foi Dapaz no final do mandato faltando um ano pra terminar, que foi na época de Luiz Cândido em 1982. Ainda morava no sítio. Eu vinha de bicicleta, com o paletó nas costas.A sessão era uma vez por semana.

JU – E nas campanhas tinha discursos?

NF - Não. Só saía de casa em casa pedindo o voto aos amigos e parentes.

JU – Olhando a trajetória, sempre na família do senhor ou na de Dapaz tinha uma pessoa que era candidata, não era isso?

NF – Sim.

JU – E na época que o senhor foi candidato a prefeito?

NF - Eu fui candidato em 1976 quando Rosvaldo era prefeito. A gente pensava em Antonio Lopes ser candidato do nosso grupo. Antonio Lopes rompeu com Rosvaldo e não quis mais. Aí Rosvaldo, Elizeu Freire, Zezé, me chamaram pra ser o candidato. Saímos por aí atrás de um candidato e pensando que Antonio Lopes ia ser o candidato. Quando foi com certo tempo, Antonio Lopes chegou perguntando se eu ia ser candidato. Então eu disse que não. “Se quiser ir, vá. Eu não vou trabalhar em política não. Aí eles começaram a dizer que eu era o candidato. Não desisti porque não tinha candidato. Depois que me botaram eu não queria desistir. De um lado era Zé Lopes e Nem e o outro era eu e Raimundinho de Luquinha. Tinha ainda outro que era Zezé e Oton. Tive 900 votos, Zezé teve 400 e poucos. Somando tudo deu 1300 e tantos. Sei que nós perdemos a eleição com 103 votos. O apoio de Zé Lopes foi da família toda e Nem trouxe todos os votos de Umari. Nós tivemos os votos do Poré. O pessoal que era chefe político era todos com Zé Lopes. Depois daí eu não quis mais entrar na política não. Ainda tentaram pra que eu fosse o vice de Valério, mas eu disse que me deixasse de fora que eu não ia mais não.

JU – Sabemos que hoje quem está à frente dos negócios da farmácia é Naelson, seu filho. Como surgiu essa iniciativa?

NF - Quando eu me aposentei, meu plano era fechar. Naelson fez uns concursos e não passou. Aí ele disse que queria ficar aqui. Depois eu disse que se ele quisesse ficar, podia ficar que eu não queria mais. Eu só estou aqui pra ajudar a ele. Eu gosto de ficar aqui de lado. Gosto de ficar aqui quando ele está, mas só pra ajudar a ele.

JU – Sabemos que antigamente as farmácias não tinham concorrentes. E hoje vende remédio até pela internet. O que o senhor diz a respeito disso?

NF - Antigamente chegava os fiscais da Covisa perguntando onde era o comércio que vendia comprimido. A gente não ia dizer pra não pegarem, mas se eles pegassem levava tudo. Hoje pode vender em qualquer canto. É ilegal, mas eles vendem. Não tem fiscalização. Quem fiscaliza hoje é a vigilância sanitária.

JU – Sabemos que hoje é difícil administrar qualquer empresa por motivo dos encargos tributários, os impostos. Farmácia paga muito imposto?

NF - Paga. A farmácia paga pelo que compra. O imposto é na compra. É 17% do lucro. Paga taxas federais. A gente paga pela nota fiscal que a gente usa. Paga 6% da fatura. Se vender R$ 10.000,00 a gente vai pagar R$ 600,00. E a taxa anual que é 700 e poucos reais ao Conselho Regional de Farmácia, além do pagamento ao bioquímico que vai uns dois ou três salários por mês. Ele é o responsável pela farmácia. Tem ainda o contador.

JU – Qual o remédio mais vendido?

NF - Hoje eu não sei bem porque cada médico é diferente. Mas, o pessoal tinha preferência em biotônico.

JU – Remédio controlado, que é de tarja preta, é muito vendido?

NF - É muito vendido, principalmente diazepan e os remédios pra gripe. Os médicos não gostam muito de passar vitaminas mais não. Antigamente eu comprava uns duzentos vidros de vitaminas e não dava.

JU – Os postos de saúde distribuem camisinhas. Na farmácia vende muito?

NF - Vende. Vende muito no carnaval. Hoje todo mundo vem comprar. O pessoal não se acanha mais não. Hoje é normal. No começo se um homem viesse comprar e tivesse uma mulher aqui, o homem não comprava na frente dela. Chamava num cantinho e pedia. Hoje até umas meninas chegam e pedem. Até o viagra tá normal.

JU – Uma coisa que tem em todo canto é o fiado. O fiado aqui tem muito?

NF - Tem muito. O bar eu deixei porque vendia muita cachaça fiado. Aqui também tem muito fiado.

JU – O senhor acha que o fiado prejudica?

NF - Eu não acho ruim não. Tem caba que me deve que até hoje não mais apareceu. Eu acho bom vender fiado a quem paga. O fiado que está encostado, o pessoal nem vem comprar mais. Trinta e poucos anos de comércio eu sei quem paga e quem não paga.

Fonte: Jornal de Upanema

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